Os paralelipipedos de basalto luzidio, banhados pela chuva, cresciam desmedidamente como écrans negros gigantes, vistos por aqueles olhos fixos por detrás das vidraças.
Ideias que tinha, às vezes assaltavam-na como se fossem gigantes que a engoliam.
Ficava presa delas por tempos infindos.
Ainda hoje era concerteza de olhar sonhador que revia a sua juventude em Lisboa.
Por essa altura andava-se mais de carro eléctrico e era ainda em burros e carroças que chegavam os víveres ao mercado da Ribeira vindos dos arredores.
Nos bairros populares os candeeiros eram acesos à noite por um homem que voltava de manhã para apagá-los.
As mercearias de bairro vendiam quartas de açucar, litros de grão e de feijão e postas e caras de bacalhau que embrulhavam em papel vegetal e depois em papel pardo.
Nas limpezas usavam-se as barrelas e sabonárias e havia o sabão amarelo para o soalho.
Nas drogarias e farmácias vendiam-se coisas muito pouco complicadas que resolviam os problemas das nódoas e das enfermidades mais corriqueiras.
Crescera assim embalada numa espécie de neblina que suporta e sustenta uma ingenuidade genuina, mas esta brigava sempre com o resto do dia a dia, até que um dia pensou que nunca se integraria, seria rebelde sempre... e sózinha.
2 comentários:
Lisboa, essa cidade mulher que em si alberga, com carinho, toda uma multidão que a ama tanto... Cidade especial, com ALMA! Cidade que nos faz sentir vivos, nos seus recantos pacatos, na animação das suas ruas íngremes, na zona perto do Tejo...
Que belas recordações!
Isabel
Coisas antigas já passadas
Que traziam inocência
De outras coisas acabadas
Que cheiravam a emanência
Emanência da simples vida
Vivida naquela descoberta
De quem em si dá guarida
E deixa sempre a porta aberta
Porta aberta para sonhar
E também para (se) descobrir
Que a vida é feita a tropeçar
A saber, a sonhar e a intuir
Muito bonito
José António
Enviar um comentário